2023/01/19

A singularidade da Escola Primária de Alijó ou a primazia da intermodalidade dos espaços educativos: algumas considerações

Edifício escolar de 3 salas de aula, com cantina e residência para professor, do tipo Indefinido, para a vila de Alijó, distrito de Vila Real. Inclui as peças desenhadas da planta geral (representação esquemática das três salas de aula, átrio central de configuração hexagonal, recreio coberto, refeitório, cozinha, arquivo e distintas instalações sanitárias). Fachada principal com cobertura, assente em 4 colunas de estilo dórico, átrio central com 6 faces, encimado por uma esfera armilar e a representação de um cata-vento com representação de ave.


O processo referente da Escola Primária de Alijó, encontra-se à guarda da Direção de Serviços de Documentação e de Arquivo da SGEC. A documentação deste processo encontra-se extremada entre junho a setembro de 1969. Inicia-se com um Memorial da Câmara Municipal de Alijó, que foi entregue ao ministro da Obras Públicas (1), aquando da visita deste governante à cidade de Vila Real a 20 de junho de 1969. Da exposição necessariamente sintética, se dá nota que a edilidade alijoense “(…) tem vindo, com uma regularidade impressionante, a dar execução ao plano de construção de edifícios escolares para a instrução primária. Todos os núcleos escolares têm sido dotados com o seu edifício próprio e dezenas de edifícios novos se espalham pelo concelho. Apenas na Vila de Alijó não existe um único edifício do plano. Os edifícios que existem são um do tipo Conde de Ferreira, outro do tipo Adães Bermudes e o outro não tem tipo definido.” Fazendo menção que os edifícios existentes “(…) são insuficientes para a população escolar existente”, aparentemente por se encontrarem fisicamente muito afastados, a pretensão do executivo camarário funda-se na necessidade de um novo edifício escolar, composto por 6 salas, atendendo que para tal desiderato a Câmara oferece o respetivo terreno. Com despacho datado de 5 de julho, o Memorial é encaminhado para a Direção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, que por sua vez o encaminha para a Delegação para as Obras de Construção de Escolas Primárias, que funcionava na dependência daquela Direção Geral.

Após os trâmites processuais, as delongas expetáveis e demoras razoáveis para o período do veraneio de 1969, a pretensão da Câmara, com os elementos técnicos reunidos pelos vários organismos públicos envolvidos, é posta à consideração do ministro das Obras Públicas a 12 de setembro. Desta feita, a resposta não se fez esperar, e a 24 de setembro, o chefe do gabinete do ministro das Obras Públicas (presidia ao ministério o engenheiro Rui Alves da Silva Sanches), manda notificar a edilidade de Alijó da decisão governamental. A comunicação, que teria dececionado o executivo camarário fundamentava-se na seguinte explanação: “(…) que o Plano de Construções Escolares só prevê a construção de um edifício de 2 salas de aula na Vila de Alijó, e a execução desta obra ainda não foi pedida pelo Ministério da Educação Nacional, pelo que não se acha programada.”


Imagem do edifício escolar de 3 salas de aula, com cantina e residência para professor, do tipo Indefinido, do núcleo de Alijó, distrito de Vila Real. Alçado principal e plantas do edifício na escala de 1:100 e planta topográfica de enquadramento urbanístico na escala de 1:500

 

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Brevíssimas considerações sobre a arquitetura e espaços envolventes da Escola Primária de Alijó

Numa observação a olho nu, torna-se fácil constatar que esta Escola Primária de Alijó constitui um modelo isolado face às tipologias clássicas definidas pelo Plano dos Centenários, no tocante às construções escolares. Não obedecendo às clássicas tipologias do Plano (tipologias Douro Granito – como acontece em Vilarandelo, concelho de Valpaços - ou tipo Xisto – como no caso de São Miguel de Lobrigos, concelho de Santa Marta de Penaguião -, apenas para citar dois exemplos avulsos que são predominantes no distrito de Vila Real), as distintas áreas da Escola Primária de Alijó denotam uma interdependência funcional e organizativa do espaço escolar. O átrio central, formando um poliedro hexagonal, aparenta ser o elemento arquitetónico a partir do qual se distribuem os restantes espaços escolares; com efeito, daqui se distribuem as 3 salas de aula, o recreio coberto, o refeitório e cozinha anexa, bem como as instalações sanitárias e outros espaços de apoio à vida escolar. A planta do rés-do-chão permite identificar num dos lados do hexágono, um espaço reservado ao arquivo, outro reservado a um vestiário comum de apoio à comunidade escolar e um reduzido vértice reservado a arrumos. Todos os outros lados, dão acesso direto às salas de aula nºs 1 e 3; a um corredor de acesso à sala nº 2 e ao recreio coberto, que compreende um pequeno alpendre, cujos 5 degraus descendentes, dão acesso ao referido recreio. Os sanitários masculinos, de tipologia térrea, vulgarmente conhecidos por retrete turca, modelo muito comum nas escolas públicas deste período, encontram-se ao fundo do recreio coberto. O refeitório tem um único acesso pelo recreio e encontra-se contíguo à cozinha. A partir da representação da planta, podemos inferir que as instalações sanitárias femininas se encontram cinco degraus acima do recreio, espaço aparentemente comum aos dois sexos, porque aqui também existem 6 lavatórios das mãos, que serviriam de suporte às refeições de toda a comunidade escolar. Em espaço contíguo à cozinha, aparentemente com acesso através de porta, podemos percecionar o espaço destinado ao professor (a), constituído com um quarto com janela para o exterior, uma sala com dimensões assinaláveis e com saída para o exterior e casa de banho devidamente equipada.

Anexo à sala nº 3, mas devidamente independente, encontramos um hall e uma sala, que eventualmente serviriam para espaço de estudo ou uma pequena biblioteca escolar, de apoio aos alunos. Estes dois espaços, estão ainda servidos por um lavatório de mãos e sanitários. Na planta do 1º andar, a que se acede por três lanços de escadas, encontramos um quarto de generosas dimensões, com janelas exteriores para dois dos lados e um pequeno pátio triangular, aparentemente externo ao edifício. A planta da cave, que é em todo similar ao espaço do 1º andar, é constituída por um espaço que indicia ser uma dispensa de apoio à cozinha, bem como um espaço destinado a arrumos (aparentemente para produtos de limpeza e consumíveis). Em termos de representação gráfica, quer as plantas dos três níveis, quer o alçado principal, encontram-se na escala de 1:100, sendo que a planta topográfica de enquadramento urbanística, encontra-se na escala de 1:500. Os desenhos técnicos são da responsabilidade da Delegação para as Obras de Construção de Escolas Primárias, na dependência direta da Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais do Ministério das Obras Públicas, estando datados de 22 de agosto de 1969.  


(Imagem da fachada do Agrupamento de Escolas D. Sancho II, Alijó, retirada da internet)

O atual Agrupamento de Escolas de Alijó (D. Sancho II), sediado na mesma vila duriense, herdeiro da Escola Primária que abordámos, é hoje um modelo de atualidade no panorama do ensino. Abrangendo nove estabelecimentos de ensino dispersos pelo concelho, desde o pré-escolar até à conclusão do ensino secundário, tem uma oferta formativa que vai desde os cursos científico-humanísticos (Ciências e Tecnologias, Ciências Socioeconómicas e Línguas e Humanidades), até aos cursos profissionais, de carácter mais prático e mais direcionados para a vida ativa, após a conclusão do 12º ano, não invalidando contudo o acesso ao ensino superior. Concomitantemente, o programa Erasmus +, incidindo nas áreas da educação, da formação, da juventude e do desporto, permite aos alunos intercâmbios com outras realidades, nomeadamente formando parcerias com Espanha, Lituânia, Grécia, França e Eslovénia. Prova reforçada desta vitalidade, é também a atribuição do Selo de Conformidade EQAVET atribuído pela Agência Nacional para a Qualificação e Ensino Profissional (ANQEP)  pelo período máximo previsto de três anos, após auditoria realizada por peritos.


M. M. 

Nota adicional: o autor deste artigo lecionou na então designada Escola Preparatória D. Sancho II, no ano letivo de 1994-95, em regime de substituição, na modalidade de recibos-verdes, a disciplina de História ao 7º ano e deu aulas de Apoio a alunos do 5º e 6º anos de escolaridade.


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(1) Rui Alves da Silva Sanches (Coimbra, 29 de abril de 1919 – Lisboa, 16 de junho de 2009), sobrinho por parte da mãe do Professor Marcello Caetano, licenciou-se em Engenharia Civil pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto em 1941. Iniciou a sua carreira profissional no Ministério das Obras Públicas, na extinta Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola. Foi Engenheiro-residente da obra de rega da Veiga de Chaves, da barragem de Vale de Gaio, da obra de rega do Vale do Sado e da barragem de Silves. Chefiou a missão de Estudos Hidráulicos do Estado Português na Índia. Em 1948 foi adjunto da Missão de Estudos Hidráulicos ao sul de Angola. Em 1946 exerceu os lugares de Chefe da Fiscalização da barragem do Biópio e da Brigada Técnica de Fomento e Povoamento do Cunene, em Angola, nos anos de 1951 e 1953. Em setembro de 1968, foi nomeado ministro das Obras Públicas e em janeiro de 1970, ministro das Comunicações, assumindo ambas as pastas até 25 de abril de 1974.

 

2 comentários:

Miguel Moura disse...

Apontamento historiográfico, sem grande erudição académica, que permite conhecer um pouco dos modelos arquitetónicos do fim do Estado Novo. A então designada Primavera Marcelista duraria até ao estertor do regime, numa madrugada de Abril de 1974. Os regimes, por mais duradouros que pareçam, também implodem.

PP disse...

Bastante interessante o artigo apresentado, pois dá-nos a conhecer de forma descritiva, mas não cansativa, um dos modelos arquitetónicos desenvolvidos pelo Estado Novo.