2021/03/11

A Escola Primária de São Martinho de Anta - de um lugarejo transmontano para o resto do mundo

O processo referente à Escola Primária de São Martinho de Anta, concelho de Sabrosa, distrito de Vila Real, encontra-se à guarda da Direção de Serviços de Documentação e de Arquivo da SGEC.

A documentação mais antiga desta escola, integrada no designado Plano dos Centenários – grande empreendimento de construção de escolas em larga escala a nível nacional, pelo Estado Novo entre 1941 e 1969, como forma de comemoração do terceiro centenário da Restauração da Independência (1640) e o oitavo centenário da Independência de Portugal (1143) -, encontra-se extremada entre os anos de 1935 e 1973.

Arquivo da Secretaria-Geral da Educação e Ciência. PT/MESG/AES/ACE/C/001/17.10.03/00021

Processo referente à escola da freguesia de Sabrosa, núcleo de São Martinho de Anta

Tipologicamente, é um edifício de 2 salas de aula, misto, do tipo “Conde Ferreira”. Além de outras tipologias, o Plano dos Centenários contemplava os projetos-tipo “Conde Ferreira”, alusivos ao grande benemérito e filantropo portuense Joaquim Ferreira dos Santos, 1º conde de Ferreira (Campanhã, 1782 – Bonfim, 1866), que tendo feito fortuna no Brasil e Angola e não possuindo herdeiros legítimos, legou em forma de testamento toda a sua riqueza às mais variadas obras de carácter público – ao antigo Hospital dos Alienados no Porto, que atualmente tem o seu nome, foi concedida uma verba de 600 000 reis, e constitui talvez a sua obra de maior envergadura.

A este respeito, e atendendo a importância da educação no país, importará reter o que o conde Ferreira deixou expresso sobre a construção das escolas:

"Convencido de que a instrução pública é um elemento essencial para o bem da Sociedade, quero que os meus testamenteiros mandem construir e mobilar cento e vinte casas para escolas primárias de ambos os sexos nas terras que forem cabeças de concelho sendo todas por uma mesma planta e com acomodação para vivenda do professor, não excedendo o custo de cada casa e mobília a quantia de 1200 reis e pronta que esteja cada casa não mandarão construir mais de duas casas em cada cabeça de concelho e preferirão aquelas terras que bem entenderem".

Das 120 escolas previstas, segundo um modelo-tipo datado de 1866, com uma verba testamentária de 144 000 reis (o equivalente a 718,25 euros na conversão atual), foram construídas 91 escolas primárias, das quais 21 foram, entretanto, demolidas. As restantes 70 continuam a funcionar para os mais diversos fins, desde ensino a serviços municipais, passando por sedes de juntas de freguesias, bibliotecas, museus municipais ou mesmo instalações de forças de segurança.

Cada escola do tipo “Conde Ferreira”, seguindo um projeto apresentado em 1866, é encimada por um pequeno frontão, que lembra um campanário, com um sol em alto-relevo, apresentando-se como contraponto da igreja, com a qual procura concorrer, sendo um símbolo do positivismo nascente.

Arquivo da Secretaria-Geral da Educação e Ciência. PT/MESG/AES/ACE/C/001/17.10.03/00021

Processo referente à escola da freguesia de Sabrosa, núcleo de São Martinho de Anta

 A escola de São Martinho de Anta, contrariando a regra, não dispõe de “casa do professor” anexa, que regra geral era construída no primeiro andar destes edifícios-tipo, uma característica que ao invés, ocorre noutros núcleos, quer do concelho de Sabrosa, quer no concelho vizinho de Alijó. Atualmente, e por contato telefónico tido com o diretor da Escola Secundária de Sabrosa, ficamos a saber que a antiga escola primária de São Martinho funciona como pré-escola, sendo que a outra sala serve de cantina para as crianças.

Entre outras singularidades, a escola primária de São Martinho está ligada ao nome de Adolfo Correia da Rocha (São Martinho de Anta, 1907 – Coimbra, 1995), mais conhecido pelo pseudónimo de Miguel Torga. O futuro médico, iniciou precisamente os seus estudos primários nesta escola, antes de rumar ao Porto, a Lamego, de uma passagem de 5 anos pelo Brasil e depois à cidade dos Estudantes, onde se licenciou em Medicina no ano de 1933.

O seu primeiro título “Ansiedade” data de 1928, mas seria com “Bichos” e “Contos da Montanha”, datados de 1940 e 1941 respetivamente, que o escritor começaria a atingir a notoriedade que hoje lhe reconhecemos. A sua obra literária diversifica-se entre a Prosa, a Poesia, o Teatro, Ensaios e Discursos, tendo uma produção literária de mais de 50 títulos em 6 décadas. Seguramente marcado pelo ambiente que o viu nascer, e pelas agruras da vivência transmontana e alto-duriense, a obra de Torga é fortemente marcada por um forte cunho de traça humanista, que rejeita a divindade transcendente, omnipresente e omnisciente e centra-se muito na figura do Homem, como elemento transformador da Vida e do Devir.

A este propósito, importará referir que o pseudónimo Miguel Torga, se por um lado tem origem precisamente em dois grandes mestres das letras ibéricas – Miguel de Cervantes e Unamuno -, o apelido Torga remete para uma planta bravia de montanha, que tem raízes sobre o granito áspero das terras transmontanas, mas cujo caule é incrivelmente retilíneo. Há notícia que o médico Torga, dois anos antes na sua casa de Coimbra, e em conversa informal com Natália Correia, lhe diagnosticara uma ligeira gripe sazonal. Recomendara-lhe que passasse numa farmácia e comprasse um antipirético, o que a escritora fizera logo de seguida. Pouco tempo depois, a escritora de “Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica”, que lhe valeu uma pena de prisão de 3 anos, com pena suspensa e do programa televisivo “Mátria”, sucumbiria em março de 1993, de ataque cardíaco. Por outro lado, o escritor que consagrou a expressão “Reino Maravilhoso”, desapareceria em janeiro de 1995, vítima de carcinoma. Ambos insubmissos. Ambos intemporais.

 

Duas propostas de leitura:

ALVES, Jorge Fernandes, Percursos de um brasileiro do Porto – O Conde de Ferreira. Porto: Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 1992.

DACOSTA, Fernando, Os Mal-Amados. Lisboa: Casa das Letras, 2008.

Descrição da Escola de São Martinho de Antas, no site SIPA: http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=12913


A. M. 

 

2021/03/08

Património Material de Portugal: Centro Histórico do Porto

 

O centro histórico do Porto faz parte do património mundial classificado pela UNESCO desde 1996.

Esta área corresponde ao tecido urbano de origem medieval, num total de cerca de 49 hectares, e inclui zonas na freguesia da Sé, São Nicolau, Vitória e Miragaia. As origens medievais da cidade estão ainda muito presentes na organização e na estética, o que lhe confere uma imutabilidade e identidade única. Aqui se inclui parte da cidade anterior à muralha Fernandina do século XV e áreas adjacentes.

Entre os monumentos mais relevantes podemos enumerar alguns de maior destaque:

    - Alminha da Ponte

    - Antigo Clube dos Ingleses

    - Cadeia da Relação

    - Capela dos Alfaiates, Capela de Nossa Senhora da Silva; Capela do Senhor dos Passos; Capela da Nossa Senhora do Ó

    - Casa do Cabido; Casa do Despacho da Ordem Terceira de São Francisco; Casa dos Infantes; Casa dos Maias

    - Chafariz da Colher; Chafariz da Rua Escura; Chafariz da Rua de São João; Chafariz da Rua das Taipas

     - Estação de São Bento

    - Estátua Equestre de D. Pedro IV

    - Fontanário do Lago da Sé

    - Igreja da Misericórdia do Porto; Igreja de Nossa Senhora da Vitória; Igreja da Ordem do Terço; Igreja de Santa Clara; Igreja de São Bento da Vitória; Igreja e Torre dos Clérigos

    - Mercado Ferreira Borges

    - Monumento ao Infante D. Henrique

    - Mosteiro da Serra do Pilar

    - Palácio da Bolsa

    - Ponte Luís I e D. Maria

    - Praça da Ribeira

    - Sé do Porto

    - Zona ribeirinha e caves do vinho do Porto

A cidade é habitada desde a Idade do Bronze e a sua história reflete a formação do país, uma vez que foi o “berço” do Condado Portucalense. O Douro tornou-se, desde sempre, um vetor económico, uma via de comunicação e um elemento agregador.

O primeiro foral foi concedido em 1120 pelo Bispo D. Hugo, a quem D. Teresa tinha doado a vila. Durante o período da primeira dinastia, o Porto desenvolveu-se através da atividade portuária e das relações internacionais. A partir do século XV, a burguesia mercantil tinha uma enorme importância e a cidade tomou as funções de centro económico e administrativo. Foi esta burguesia que apoiou D. João I que acabou por se casar na Sé do Porto com D. Filipa de Lencastre em 1387. A família real passou largas temporadas nesta zona e aqui nasceu o Infante D. Henrique em 1394. Com o início das expedições ao Norte de África e explorações marítimas, a burguesia endinheirada em muito contribuiu para o seu financiamento.


No século XVI a arquitetura pós Concílio de Trento levou à construção de inúmeras igrejas em estilo barroco, responsáveis pela transformação estética da cidade.

Os séculos XVII e XVIII marcam a época dos grandes palacetes de habitação numa tentativa de espelhar a riqueza e opulência da burguesia endinheirada e da nobreza. Ao mesmo tempo são levados a cabo vários trabalhos de utilidade pública como é o caso da reconstrução da Alfândega em 1667 e da Cadeia e Tribunal da Relação em 1765, ou de um novo sistema de circulação.

Durante vários séculos o Porto manteve-se uma cidade próspera e economicamente muito ativa. O incrementar do comércio do vinho do Porto no século XVIII foi um processo decisivo em todo este desenvolvimento, sobretudo através do comércio privilegiado com Inglaterra. Por toda a cidade surgem elementos de inspiração britânica, com os clubes privados e os grandes jardins.


Ao longo do século XIX, a cidade do Porto foi palco de acontecimentos políticos de enorme relevância para o país. O período que se seguiu à revolução liberal foi marcado pelo melhoramento das áreas urbanas, incluindo os transportes e as áreas de lazer. Os jardins e praças públicas “florescem” por toda a cidade. É a altura da construção do Palácio da Bolsa, da Ponte D. Luís e D. Maria.

No início do século XX a tendência arquitetónica seguida é a francesa. São deste período a Estação de São Bento e a Avenida dos Aliados.

 

MJS