A Universidade de Lisboa está a comemorar o seu centenário. Os edifícios da Reitoria e das Faculdades de Letras e de Direito constituem o trio emblemático da Cidade Universitária que se ergueu nos anos 50 com o traço característico do arquiteto Pardal Monteiro. O fundo relativo a construções universitárias inclui projetos de arquitetura e documentação escrita relativa a variadíssimos edifícios, na sua maioria de Lisboa, mas também do Porto e de Coimbra.
Foi recentemente objeto de descrição arquivística pelas técnicas
superiores da DSID (Direção de Serviços de Documentação e Informação) estando
em breve disponível para consulta para os investigadores com interesse em
recuperar a história das construções universitárias.
Essa história faz-se, não apenas dos projetos que resultaram em
obras, em espaço edificado e hoje vivenciado, mas também dos processos de
intenções, dos planos que, por algum motivo, não tiveram seguimento e que, por
isso, refletem as vicissitudes dos processos políticos e decisionais que
envolveram a construção dos edifícios universitários ao longo das décadas
centrais do Estado Novo.
Um desses projetos nunca concluído é o projeto para a Praça da
Universidade da autoria do Arquiteto M. Norberto Corrêa. O espaço que ficou entre
estes edifícios hoje parque de estacionamento e relvado, foi objeto, também
ele, de um projeto de intervenção urbanística que, a ser construído, lhe teria
dado feição bem diferente. O projeto incluía nas suas intenções não apenas o
tratamento do espaço central da cidade universitária, hoje ocupado por um
extenso relvado, mas também a reorganização dos eixos de circulação envolventes
até ao Campo Grande, inclusive.
Os fundos incluem um “Estudo de Composição”, datado de 1958, e um
Anteprojeto, bem mais extenso e detalhado, datado de 1960. Mas num deles o
arquiteto refere-se a um “Estudo Prévio para um anteplano de urbanização da
Cidade Universitária de Lisboa” de 1955.
Na memória descritiva do Anteprojeto de 1960, Norberto Corrêa esclarece
que procurou integrar o seu projeto, tanto quanto possível, na conceção geral
do conjunto de edifícios destinado à reitoria e às faculdades de Letras e
Direito, que estava previsto, desde há 20 anos, encontrando-se, nesse momento,
parcialmente construído.
Refere igualmente que, em 1955, a sua intenção inicial seria
desenhar um vasto espaço empedrado destinado a cortejos e cerimónias
universitárias, dando total primazia à circulação pedonal e reduzindo ao mínimo
o acesso a veículos, privilegiando a noção de “campus universitário”. Mas que,
para este seu anteprojeto de 1960, lhe teria sido comunicado um outro sentido
programático, que incluía assegurar, em boas condições, o acesso aos edifícios,
e conceber um conjunto monumental na zona central.
Dando cumprimento a esta encomenda, o arquiteto apresenta um
projeto com uma peça escultórica central, vertical, assente numa base em
alvenaria e betão, ladeada por um extenso espelho de água, para o qual são
previstos jogos de luz e água.
As dimensões e o volume da peça central foram estudados em função
da altimetria dos edifícios envolventes, e em função da possibilidade de ser
avistada a grande distância, “desde a ligeira encosta da Avenida [do Brasil] de
acesso até à parte fronteira ao Hospital Júlio de Matos”. (p. 11). E “para
enquadramento da perspetiva que de longe se abre sobre a avenida de acesso,
admitem-se dois volumes de edificações sobre-elevados a rematar a Av. do
Brasil”. (p. 9).
O projeto incluiu o estudo de composição de jogos de água, os
quais, para dias festivos, incluíam “dois anéis de jactos de água, com
orientação definida, rodeando a peça vertical”, e “duas faixas longitudinais,
dispostas de cada lado nas restantes curvas, com jactos de água orientáveis”
(p. 14). Este movimento seria “acompanhado luminotecnicamente pelo
funcionamento de várias fiadas de projectores” (p. 14), estando prevista uma
“variabilidade de intensidade, cores e tonalidades” (p. 15) em conjugação com a
possibilidade de alterar a dimensão e intensidade dos jogos de água.
No seu conjunto, para além da Memória Descritiva, este Anteprojeto
inclui 15 peças desenhadas, desde a planta de localização, à escala 1:2000, até
aos desenhos de por menor e esquemas de jogos de água e luz, a 1:100, 1:50 e
1:20.
A proposta inclui ainda uma Estimativa de trabalhos de construção
civil, da autoria do Engenheiro J. Ferry Borges, que previa, para a execução
deste projeto da “Praça da Universidade”, um orçamento total de 4.300 contos.
Finalmente, este documento permite identificar outras
intencionalidades, muito interessantes, qua não fariam parte do âmbito deste
projeto de Praça. Assim, concretamente, pela legenda da planta de localização
podemos verificar que, para o local onde atualmente se situa o Instituto de
Educação e Faculdade de Psicologia, estava prevista uma “Capela da
Universidade”; e para o local da atual Torre do Tombo, uma dupla de edifícios destinados
a “Hall de Exposições” e “Livraria da Universidade”. Entre os dois, na zona
onde o espaço relvado se torna menos largo, estava prevista uma “Estação de
Metro com Centro Comercial”.
Caso tivessem sido construídos, estes equipamentos teriam, necessariamente,
dado uma configuração diferente a toda a circulação de pessoas e automóveis
neste espaço amplo da Cidade Universitária de Lisboa. Teria sido outra a sua
vivência, a sua evolução, a sua História.
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