As tabuinhas, ao estilo de uma moderna
biblioteca, eram colocadas de modo ordeiro em prateleiras. Na sua generalidade,
tratava-se sobretudo de textos comerciais e administrativos, económicos,
diplomáticos, religiosos, até mesmo epistolares, que nos introduzem na vida do
palácio.
«Em
1984, descobriram-se em Tell Brak, na Síria, duas tabuinhas de argila quase
retangulares, datando do quarto milénio antes da nossa era. Vi-as, um ano antes
da Guerra do Golfo, numa vitrina banal no Museu de Arqueologia de Bagdade. São
objetos simples, pouco impressionantes, ambos portadores de umas marcas discretas:
um buraquinho em cima e uma espécie de esboço de animal ao centro. Um desses
animais talvez seja uma cabra e, nesse caso, o outro será provavelmente uma
ovelha. O entalhe, dizem os arqueólogos, representa o número dez. Toda a nossa
história começa com estas duas modestas tabuinhas.»
(Alberto Manguel, pág. 55)
A
Escrita Cuneiforme – uma inscrição para a posteridade
A escrita cuneiforme dos sumérios é adaptada às exigências da língua eblaíta, de origem semita. O sistema gráfico cuneiforme é constituído por símbolos em forma de cunho, marcados na argila por meio de uma cana com uma ponta em forma de cunha. Na sua origem os símbolos representavam, em forma de pictograma, os objetos. Mais tarde, os símbolos evoluíram e passaram a representar uma só consoante. Tratou-se, de facto, de uma grande revelação, pois, até então, pensava-se que no terceiro milénio apenas os sumérios utilizassem a escrita e não se imaginava que as cidades sírias pudessem ter adotado, por sua vez, esse tipo de escrita.
(Alberto
Manguel, pág. 234)
Ebla – uma biblioteca enciclopédica, 300 anos
antes de Alexandria
Embora já se tivesse conhecimento de inscrições
em escrita cuneiforme desde o século XVII, essas inscrições eram tidas como
indecifráveis e, por vezes, consideradas mesmo como simples ornamentos.
Tabuinhas com “pegadas de pássaros”, assim se referiam a essas inscrições.
Acresce o facto da própria escrita cuneiforme ter sofrido alterações pela
evolução que registou o que se reflete nas diferentes características e
subtilezas encontradas nos fragmentos. Encontraram-se tabuletas com dados
gerais sobre obras com referências à autoria, número de linhas e diversas
informações complementares do documento.
Verificou-se, igualmente, que estes povos tinham alcançado um tal nível
de cultura que os conduziu, mesmo, à elaboração de um dicionário e da primeira obra literária escrita: a “Epopeia
de Gilgamesh”.
«A
escrita cuneiforme sobreviveu efetivamente aos impérios da Suméria, de Acádia e
Assíria, conservando a literatura de 15 línguas e cobrindo uma região ocupada
atualmente pelo Iraque, pelo Irão ocidental e pela Síria. Não somos hoje
capazes de ler as tabuinhas pictográficas como língua, porque desconhecemos o
valor fonético dos seus signos; conseguimos apenas reconhecer uma cabra, uma ovelha. Mas os linguistas conseguiram
reconstituir a pronúncia dos textos sumérios e acadianos mais tardios e
podemos, ainda que de modo rudimentar, pronunciar sons gravados há milhares de
anos.»
(Alberto Manguel, págs. 238 - 239)
De facto, entre as composições mitológicas e epopeias,
sobressai a “Epopeia de Gilgamesh”, o épico da primeira dinastia babilónica,
escrita um milénio antes de Homero (1900 a.C.). Gilgamesh, considerado o
Ulisses assírio, é um herói em busca da imortalidade. Entre os diversos factos
que aí são relatados, figura o dilúvio, confirmando, assim, a Bíblia; embora
com um fundo teológico diferente. A versão mais completa que chegou aos dias de
hoje consta de doze tabuinhas de argila. O babilónico antigo (2000 - 1500
a.C.), com o seu esplendor literário, é representado, também, por inúmeras
inscrições, de onde sobressai o célebre “Código de Hamurabi”.
(continua)
JMG


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