A educação de adultos em Portugal, tal como a
conhecemos hodiernamente, é recente. Em finais de 1975, com a reestruturação
dos serviços da Direcção-Geral da
Educação Permanente, começa-se a definir o sistema nacional de educação de
adultos, o chamado Plano de Educação de
Adultos. Em 1976, a Portaria n.º 419/76, explicita, no seu preâmbulo, a
nova conceção da educação:
“Tem-se verificado, porém, que a
perspetiva adotada de encorajar um processo de aprendizagem relativamente aos
adultos, que faça destes - individualmente ou em grupo - sujeitos da sua
própria educação e agentes criadores de uma verdadeira cultura nacional, não se
compadece com a manutenção em vigor das portarias que regulam os programas e
exames da chamada ‘4ª classe para adultos’.
Neste sentido, não é relevante a
existência de programas rígidos - contendo marcos de um saber teórico
desenraizado da prática das populações. Opta-se aqui pela definição de
capacidades a desenvolver e a demonstrar pelos adultos, em função das suas
zonas de interesses ou de intervenção.” (Portaria n.º 419/76)
A Portaria acima mencionada define normas orientadoras
do processo de aprendizagem e, simultaneamente, estabelece critérios da
avaliação final de educação de adultos. Esta nova conceção de educação assenta
na elaboração de programas intersubjetivos, ou seja, os marcos teóricos de
aprendizagem devem ser canalizados para as necessidades reais da população,
diremos dos interesses e aptidões a desenvolver pelas comunidades escolares.
Os cursos gerais de ensino secundário
recorrente, por sua vez, são criados pelo Despacho nº 273/ME/92, de 10 de
Novembro. Por seu turno, o Despacho n.º 41/SEED/94, de 14 de Junho, cria, em
regime experimental, cursos técnicos de ensino secundário recorrente.
“Considerando que o Decreto-Lei nº 74/91, de 9
de Fevereiro, no artigo 10.º, determina que os planos curriculares do ensino
secundário recorrente sejam estabelecidos em função das características e
necessidades dos destinatários, devendo os mesmos incluir componentes de carácter
regional e de natureza artística e profissional; Tendo em conta o disposto nos
Despachos nºs 273/ME/92, de 10 de Novembro, e 41/SEED/94, de 14 de Junho;
Assim, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 74/91, de
9 de Fevereiro, e no nº 8 do Despacho Normativo nº 193/91, de 5 de Setembro
[…].” (Portaria nº 144/98)
Como verificamos, a Portaria n.º 144/98 de 6 de março (D.R.
Série B, n.º 55, 1998), tal como a portaria anteriormente referida, n.º 419/76, consolidam a mesma preocupação: os programas
devem ser estabelecidos em função das características e necessidades dos
destinatários.
“O ensino
recorrente de adultos insere-se numa política de educação que visa
permitir a frequência dos ensinos básico e secundário aos indivíduos que já não
se encontram em idade escolar normal no ciclo de estudos que vão frequentar.
[…]. Os planos curriculares e os programas e métodos de estudo são organizados
de forma diversificada, tendo em conta os grupos etários a que se destinam. O
ensino recorrente faculta a obtenção de certificados e diplomas equivalentes
aos do ensino regular.” (Mesquita, 2007:49)
Mesquita (2007:49) reforça a ideia de que os planos
curriculares são organizados de forma diversificada de modo a suprimir lacunas
educacionais dos grupos etários a que se destinam. Assim sendo, a pergunta
urge: o que é e em que consiste o ensino de adultos, nomeadamente, o ensino
recorrente?
O ensino recorrente correspondeu a uma vertente da educação
de adultos, em contexto escolar, proporcionando uma segunda oportunidade de
formação que permita conciliar a frequência de estudos com uma atividade
profissional, compreendendo cursos científico-humanísticos. Os cursos
organizam-se por disciplina, em regime modular (três módulos capitalizáveis por
ano), segundo um referencial de três anos, e podem ser frequentados nas
modalidades (i) presencial e (ii) não presencial.[1]
“Verificamos que no ensino
recorrente, devido à especificidade dos seus alunos, na maioria trabalhadores
estudantes, haveria necessidade de se implementar um espaço alternativo de
discussão. Este serviria de prolongamento do espaço físico da sala de aula.
Aqui, os alunos, moderados pelo professor, sempre que necessário, podem tecer
comentários, tirar dúvidas e esclarecerem-se uns aos outros. Isto é,
contribuem, em conjunto, para uma aprendizagem colaborativa.” (Gomes, 2006:3)
O público que frequentou esta modalidade de ensino foi, no
entender de Gomes (2006:3) um estrato específico de alunos, tornando, assim,
indispensável a criação de espaços e estruturas escolares alternativas que, a
seu modo, primavam por um objetivo comum – a aprendizagem colaborativa.
Todos os cursos do ensino recorrente conferiam aos
formandos diplomas do ensino secundário, certificavam a qualificação
profissional e davam acesso a estudos de nível superior. Grosso modo, este
processo educacional apresenta-se como uma modalidade especial de educação que,
em termos sociais, protagonizava o acesso a direitos fundamentais de educação e
cultura.
O ensino recorrente, nos contextos políticos de
então, foi a resposta a uma realidade concreta - o insucesso escolar -, provenientes de consideráveis assimetrias
sociais, que, a todo o custo convinha minimizar por vários motivos, a saber:
a.
Credenciar a comunidade que
não usufruiu, na idade própria, da escolaridade dita “normal”;
b.
Reintegrar adultos e jovens no
mundo do trabalho, através da especialização profissional;
c.
Flexibilizar e adequar
vivências, necessidades, problemas e interesses de grupos sui generis;
d.
Criar condições necessárias a
uma formação centrada no aluno, respeitando o seu ritmo individual de
aprendizagem;
e.
Disponibilizar métodos e meios
- unidades capitalizáveis (UC) - para
cumprir a missão da escola e o itinerário individual de cada aluno.
Segundo o N.º 2, do Artigo 5 (oferta formativa) do D.R.,
1.º Série, n.º 70 de abril de 2011, o ensino secundário recorrente visa
proporcionar uma segunda oportunidade de formação que permita conciliar a
frequência de estudos com a atividade profissional e compreende: a) cursos científicos-humanísticos, b) cursos tecnológicos e c) cursos artísticos especializados.
Estes
cursos possibilitam a aquisição de conhecimentos e competências ao nível do
ensino secundário, permitindo a obtenção de um certificado escolar de 12º
ano e, no caso dos cursos tecnológicos e dos cursos do ensino artístico
especializado, uma qualificação profissional de nível 3. No âmbito da Reforma do ensino secundário, existiram
os seguintes cursos do ensino secundário recorrente:
Cursos Científico-humanísticos:
- Curso de Ciências e Tecnologias;
- Curso de Ciências Socioeconómicas;
- Curso de Ciências Sociais e Humanas;
- Curso de Línguas e Literaturas;
- Curso de Artes Visuais.
Cursos Tecnológicos
- Curso de Construção Civil e Edificações;
- Curso de Eletrotecnia e Eletrónica;
- Curso de Informática;
- Curso de Design de Equipamento;
- Curso de Multimédia;
- Curso de Administração;
- Curso de Marketing;
- Curso de Ordenamento do Território e Ambiente;
- Curso de Ação Social;
- Curso de Desporto.
Cursos Artísticos Especializados
- Curso de Comunicação Audiovisual;
- Curso de Design de Comunicação;
- Curso de Design de Produto;
- Curso de Produção Artística.
Como verificamos, a modalidade de opções de ensino é
englobante e os seus destinatários não são menos abrangentes. Segundo o Relatório de base de Portugal (OCDE,
2003:16) esta modalidade de ensino:
“Destina-se à escolarização de indivíduos que
já não se encontram na idade escolar normal de frequência dos ensinos básico (a
partir dos 15 anos) e secundário (a partir dos 18 anos). Existe oferta de
ensino recorrente para todos os níveis escolares não superiores. O ensino
recorrente organiza-se segundo um plano de estudos, adequado ao nível etário a
que se destina e atribui certificados e diplomas equivalentes aos conferidos
pelos ensinos básico e secundário regular: certificado de iniciação
profissional (nível I) e certificados de qualificação profissional (nível II e
III).” (OCDE, 2003:16)
A abrangência deste relatório é assinalável, o
ensino básico e o secundário, não obstante, existem algumas alterações
políticas em todo este percurso educacional. Por conseguinte, a Portaria
nº 550-E/2004, de 21 de maio, criou diversos cursos científico-humanísticos,
tecnológicos e artísticos especializados e aprovou os respetivos planos de
estudo, estabelecendo os princípios orientadores da organização e da gestão do
currículo, bem como a avaliação e certificação dos cursos de ensino recorrente
de nível secundário, nos termos estabelecidos pelo Decreto-Lei nº 74/2004, de
26 de março, retificado pela Declaração de Retificação nº 44/2004, de 25 de
Maio.
O Decreto-Lei nº 24/2006, de 6 de fevereiro, retificado
pela Declaração de Retificação nº 23/2006, de 7 de abril, introduz alterações
ao Decreto-Lei nº 74/2004, de 26 de março, que importa neste momento
materializar, ajustando as regras de organização, funcionamento e avaliação dos
cursos do ensino recorrente de nível secundário definidos pela portaria
suprarreferida.
Atendendo aos reajustamentos
políticos da história da educação, a Secretaria-Geral do Ministério da Educação
e Ciência apresenta um acervo significativo de documentos – programas escolares do ensino secundário
recorrente – que, a seu modo, protagonizam e a história da educação em
Portugal a partir da década de noventa. O referido fundo está disponível na
interface própria do Ministério da Educação e poderá ser consultado in loco.
Bibliografia
DECRETO-LEI N.º 50/2011 de 8 de
Abril. Diário da República, nº 70 de
8 de abril de 2011 – I Série
DECRETO-LEI Nº 74/2004 de 26
de março. Diário da República, nº 70
de abril de 1011 – I Série.
GOMES, Álvaro Manuel Maia
(2006). Adaptação e implementação do Fórum Dyn3W: uma
experiência na disciplina de Bases de Programação do ensino recorrente (10.º
ano) [on-line]: Dissertação submetida à Faculdade de Ciências da
Universidade do Porto para a obtenção do grau de Mestre em educação multimédia
<http://nautilus.fis.uc.pt/cec/teses/alvaro/tese_completa.pdf>
[Consulta: fevereiro 2012]
MESQUITA,
Maria João Silva Teixeira Guedes (2007). b-Learning no ensino secundário
recorrente: uma proposta
baseada na construção do conhecimento [on-line]: Dissertação
apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos
necessários à obtenção do grau de Mestre em Gestão de Informação, realizada sob
a orientação Dr. Luís Borges Gouveia, Professor Associado da Universidade
Fernando Pessoa.
<http://www2.ufp.pt/~lmbg/monografias/mmesquita_msc_ua07.pdf>
[Consulta: fevereiro 2012]
OCDE (2003) Os sistemas de qualificação e do seu impacto
na aprendizagem ao longo da vida : relatório de base de Portugal [on-line]: Ministério da Educação, Ministério
da Segurança Social, da Família e da Criança
<http://www.oecd.org/dataoecd/17/19/33776836.pdf> [Consulta:
fevereiro 2012]
PORTARIA Nº 144/98 de 6 de março. Diário da República, nº 55 de 6 de março de 1998 – I Série B.
PORTARIA Nº 419/76 de 13 de julho. Diário da República, n.º 162 de 13 de julho de 1976 – I Série.
P.M.
[1] A modalidade de
frequência presencial assentava em denominadores de avaliação contínua, cuja
assiduidade era pontuada para a avaliação final. A outra modalidade, a não
presencial, dava aos alunos autonomia de aprendizagem, sendo que os alunos
realizavam provas de avaliação em datas predeterminadas.
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