«Antes da invenção da imprensa, cada livro era único. Para que existisse
um novo exemplar, alguém devia reproduzi-lo letra a letra, palavra por palavra,
num exercício paciente e esgotante. Havia poucas cópias da maioria das obras e
a possibilidade de que um determinado texto se extinguisse totalmente era uma
ameaça muito real. Na Antiguidade, em qualquer momento, o último exemplar de um
livro podia estar a desaparecer numa prateleira, devorado pelas térmitas ou
destruído pela humidade. E, enquanto a água ou as mandíbulas do inseto atuavam,
uma voz era silenciada para sempre».
(Irene Vallejo, p. 74, 2020)
Segundo narra Plínio, o Velho,
em inícios do século II a.C., Alexandria não queria ser superada por outra
biblioteca, uma vez que as bibliotecas eram, não só, reflexo de cultura, mas,
também, de poder. Assim, terá proibido a venda de papiro para a biblioteca de
Pérgamo, para que esta não mais pudesse copiar ou produzir nenhum novo livro. O
rei Eumenes II, como resposta, terá ordenado que fosse encontrado um novo
material que pudesse ser utilizado na confeção dos manuscritos, o que levou a
uma exponencial produção de pergaminho, feito a partir da pele de ovelha ou de
cabra. O próprio vocábulo “pergaminho” parece derivar do topónimo “Pérgamo”. Este
material revelou-se mais resistente, durável, podia ser utilizado de ambos os
lados e ser rasurável. A descoberta foi tão importante que a própria Alexandria
passou a adotar o pergaminho, em lugar do frágil papiro. Contudo, há que notar
que o pergaminho já vinha sendo usado noutros lugares, como a Anatólia, antes
de Pérgamo. Certo é que o uso do pergaminho, em lugar do papiro, veio também
facilitar a disseminação do conhecimento por toda a Europa e Ásia, para além de
ampliar a importância da biblioteca de Pérgamo no Mundo Antigo.
Segundo a investigadora e escritora Irene Vallejo:
«A
medida (o contra-ataque de Ptolomeu a Eumenes), poderia ter sido demolidora,
mas – para frustração do vingativo rei – o embargo impulsionou um grande avanço
que, para além do mais, imortalizaria o nome do inimigo. Em Pérgamo reagiram
aperfeiçoando a antiga técnica oriental de escrever sobre couro, uma prática
cujo uso tinha sido secundário e local até então. Em memória da cidade que o
universalizou, o produto melhorado chamou-se “pergaminho”. Cerca de quatro séculos
mais tarde, essa descoberta mudaria a fisionomia e o futuro dos livros».
(Irene Vallejo, p. 77, 2020)
A
cidade de Pérgamo haveria de cair nas mãos dos romanos no ano de 133 a.C.,
sendo a biblioteca negligenciada. Mais tarde, no ano de 1300, a cidade de
Pérgamo é conquistada pelo Império Otomano. A biblioteca manteve a sua
existência até à era cristã, embora não tenha sido muito mencionada por historiadores,
dando a entender que a sua coleção não era mais significativa. Muito mais
tarde, nas décadas de 1860 e 1870, do século XIX, surge a curiosidade e o
interesse em descobrir e reconstituir a história da grandeza de Pérgamo e da
sua magnífica e lendária biblioteca, por parte dos governos alemão e otomano.
Em 2014, o local onde se encontram ainda muitas das ruínas, foi declarado
património mundial, pela UNESCO.
REFERÊNCIAS E SUGESTÕES DE LEITURA:
(BIBLIOGRAFIA, WEBGRAFIA e ILUSTRAÇÕES)
BARBIER,
Frédéric (2018). De Alexandria às
bibliotecas virtuais. São Paulo: EDUSP.
BATTLES,
Matthew (2003). A conturbada história das
bibliotecas. São Paulo: Planeta do Brasil.
CASSON,
Lionel (2001). Libraries in the ancient
world. New Haven and London: Yale University Press.
CURIOSIDADES
EDAD ANTIGUA (2022). GUADALUPO, Irene. La
biblioteca de Pérgamo. [em linha]. [Consult. 16.09.2024]. Disponível: https://labibliotecadepergamo.com/historia/edad-antigua/la-biblioteca-de-pergamo/
OIKONOMOPOULOU,
Katerina; WOOLF, Greg (2013). Ancient
libraries. St. Andrews: Cambridge University Press.
VALLEJO,
Irene (2020). O infinito num junco.
Lisboa: Bertrand Editora.
WIKIPEDIA
(2024). Pergamon altar. [em linha].
[Consult. 17.09.2024]. Disponível: https://en.wikipedia.org/wiki/Pergamon_Altar
WORLD
HISTORY ENCYCLOPEDIA (2022). MARK, Joshua J.. Library of Pergamon. [em linha]. [Consult. 18.09.2024]. Disponível:
https://www.worldhistory.org/Library_of_Pergamon/