2020/09/10

Dos incêndios do teatro português: A Companhia de Teatro Rey Colaço- Robles Monteiro




O Arquivo Histórico do Ministério da Educação (AHME) é detentor de documentação fundamental para a compreensão da evolução histórica do atual Teatro Nacional D. Maria II. Através da Repartição de Instrução Artística (RIA) e principalmente através da Direção Geral do Ensino Superior e Belas Artes (DGESBA), podemos traçar com algum detalhe a história deste teatro nacional. Desde a nota da exploração do então Teatro Nacional Almeida Garrett pela “Sociedade Artística do Teatro Nacional Almeida Garrett”, datada de 11 de maio de 1914, passando pelas sucessivas revisões de contratos de adjudicação pela concessionária “Companhia Amélia Rey Colaço-Robles Monteiro”, despacho da reabertura do teatro antes da conclusão das obras, datado de 29 de janeiro de 1930, cedência pelo Teatro Nacional de São Carlos (TNSC) de uma roca de pedal e uma sanfona a Robles Monteiro, datada de 27 de janeiro de 1931 até ao deferimento de autorização para a realização de uma conferência literária por Mme. Marcelle Tynaire, datada de 21 de fevereiro de 1931, são vários os motivos para os quais se dá agora uma breve notícia histórica.


Fundada pelo casal Amélia Rey Colaço e por Manuel Robles Monteiro, a Companhia de teatro durou 53 anos (1921-74), sendo considerada a companhia de teatro mais duradoura da Europa. A estreia da Companhia ocorreu com a representação em cena a 18 de junho de 1921 no Teatro Nacional de São Carlos (TNSC) com a peça “Zilda” de Alfredo Cortez, demarcando-se da tradição dos espetáculos do Teatro Nacional, de onde acabavam de sair, para formar esta nova companhia. Em 1921, candidataram-se à exploração do então Teatro Nacional Garrett (futuro Dona Maria II), ganhando o concurso, malgrado as condições pouco apelativas do concurso quanto à concretização da função de um Teatro Nacional, aos custos associados, considerando as parcas ou nulas contrapartidas financeiras. Logo a 30 de dezembro desse mesmo ano estreiam-se em palco com “Peraltas e Sécias” de Marcelino Mesquita. Foi a Companhia residente do Teatro Nacional Dª Maria II (TNDM II) de 1929 a 2 de dezembro de 1964, quando ocorreu o incêndio que destruiria o edifício e todo o recheio do teatro nacional. Ainda assim, a 15 de dezembro, 13 dias depois do nefasto acontecimento, a Companhia apresentou-se nas Portas de Santo Antão (Coliseu de Lisboa), com a peça “Macbeth” de William Shakespeare sem cenários e de luto. Depois do incêndio, ocuparam o Teatro Avenida, o Capitólio no Parque Mayer e o Teatro da Trindade, ao Bairro Alto.
 Durante a década de `30, construíram um repertório nacional de 116 peças portuguesas, das quais 63 foram estreias nacionais. Durante as décadas seguintes levaram a cena (mise en scene, na terminologia francesa) grandes autores contemporâneos nacionais e estrangeiros, como José Régio, Bernardo Santareno, Francisco Rebello, Luís de Sttau Monteiro, Eugene O`Neill, Brech, Pirandello, Cocteau, Arthur Miller, Ionesco, Francisco Garcia Lorca, entre outros. As representações mais modernas eram fortemente censuradas pelo regime político, obrigando a fortes negociações por parte de Amélia Colaço e Robles Monteiro. Esta caraterística foi uma constante ao longo da vida da Companhia, cujo percurso “resume paradigmaticamente a história do teatro português sob o fascismo – no que fez, no que não fez e no que não lhe foi permitido fazer” (REBELLO 2000: 137).

Em 1931, estreou mundialmente “Um sonho, mas talvez não”, de Luigi Pirandello, com a presença do autor; estreou ainda uma placa giratória no palco, com “D. Sebastião” (1933), de Tomaz Ribeiro Colaço e em 1940 “O padre Setúbal” de Maeterlinck, escrita propositadamente para a Companhia. A partir de 1934 a Companhia fez várias digressões pela designada província, encenando grandes espetáculos ao ar livre, como o “Auto de Santo António” no adro da Sé de Lisboa (1934), a “Castro” no mosteiro de Alcobaça (1935), ou “Sonho de uma noite de Verão” (1944) no parque de Palhavã. Concomitantemente, organizou vários ciclos de conferências no Nacional, com oradores nacionais e estrangeiros a fim de alargar os horizontes culturais além da arte estritamente teatral.

Amélia Rey Colaço foi desde sempre uma figura proeminente na vida da Companhia, não só na arte estrita de representação, mas e sobretudo, no que dizia respeito à escolha de repertórios, pela distribuição dos papéis e na maioria dos casos pela montagem e decoração ( a designada encenação teatral), cujo requinte constituía uma imagem de marca. A Robles Monteiro, embora com representações mais esporádicas, cabiam outras funções de carácter administrativo e organizacional. Após a sua morte, em 1958, este papel foi sendo assumido por Amélia e pela filha Mariana Rey Monteiro, que dividia também com a mãe a direção de grupo.

A Companhia foi responsável pelo lançamento de atores de grande renome do futuro panorama teatral, como Raúl de Carvalho, Maria Lalande, Eunice Muñoz e Cármen Dolores, entre outros. Embora bem consolidada no panorama artístico nacional, a Companhia era muito exigente em matéria de coesão e disciplina, lançado para esse efeito o “Regulamento dos ensaios e espetáculos” datado de 1965.

Em 1967, novo incêndio assola a Companhia no Teatro Avenida, aquando da representação de “Feliz Aniversário” de Pinter, obrigando toda a Companhia a deslocar-se para o Capitólio (1968-70). Já no Parque Mayer, a Companhia enfrenta novo incêndio, quando se encontrava em representação “Equilíbrio Instável” de Edward Albee. Numa fase final, a Companhia deslocou-se para o Teatro Trindade, partilhando as representações com uma companhia de Ópera e Opereta. As crescentes dificuldades financeiras e o desinteresse do público – a que não seriam estranhos os tempos conturbados que se viviam no Portugal de abril de 1974 -, levaram a fundadora Amélia Rey Colaço a encerrar a Companhia em maio de 1974, após 53 anos de atividade ininterrupta.

Embora extinta a Companhia em ano de revolução, para os mais saudosos ainda é bom recordar a participação de Mariana Rey Monteiro, no papel da matriarca Dona Efígénia Augusta Lorena Marques Vila, presidente da administração da Sociedade Vinícola Marques Vila, Lda., na primeira telenovela portuguesa, Vila Faia, (RTP, maio a setembro de 1982), contracenado entre outros, com os consagrados Ruy de Carvalho, Nicolau Breyner, António Feio, Tozé Martinho e Rosa Lobato Faria – estes quatro últimos já falecidos -, Ana Zanatti, Francisco Nicholson, Glória de Matos, Vítor Norte e Margarida Carpinteiro, provas inequívocas que o teatro e a arte de representação nacionais continuam com vitalidade e em grande performance criativa.






M.M.


Outras propostas de leitura:

BARROS, Júlia Leitão de (2009). Fotobiografias século XX: Amélia Rey Colaço. Lisboa: Círculo de Leitores.

MARQUES, Paulo (2008). Amélia Rey Colaço: a Imperadora (1898-1990). Lisboa: Parceria A. M. Pereira Livraria Editora/Público.

REBELLO, Luiz Francisco (2000). Breve história do teatro português, 5ª ed. Mem Martins: Publicações Europa-América.

___ (2010). Três espelhos: uma visão panorâmica do teatro português do Liberalismo à Ditadura (1820-1926). Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

SENA, Jorge de (1988). Do teatro em Portugal. Lisboa: Edições 70.

                                                                                                                        

2020/09/07

Exposição virtual: "A Revista Je sais tout"


A revista mensal francesa, Je sais tout, foi criada por Pierre Lafitte em Paris, a 15 de fevereiro de 1905, contando com 405 números publicados. A publicação saia ao dia 15 de cada mês e esteve em circulação até 1931 com este titulo, interrompendo entre agosto e dezembro de 1914. Foi impressa nas gráficas Gustave de Malherbe & Cª. O seu formato tinha 17.5 cm por 24.5 e contava com mais de 100 páginas com diversas ilustrações.
Aqui se publicaram as obras de Maurice Leblanc, nomeadamente Arsène Lupin, bem como do famoso Arthur Conan Doyle, criador do inesquecível detetive Sherlock Holmes. O primeiro conto com a personagem Lupin, saiu precisamente no primeiro número da revista, um ladrão-cavalheiro que praticava roubos contra os ricos.
A primeira revista tinha um cariz mais enciclopédico e, na capa, apresentava uma família em que cada membro segura um telefone junto ao ouvido. No entanto, evoluiu para um novo conceito de revista de cultura geral generalista, tendo como alvo um público familiar.
Teve três fases de publicação, sendo a primeira entre 1905 e 1914, com Henri Barbusse como redator chefe, substituído por Jacques des Gachons. Entre 1915 e 1922, após a interrupção da guerra, continuou no mesmo formato. Entre 1922 e 1939 houve algumas alterações uma vez que a revista foi comprada pela Hachette e teve uma nova casa impressora. Até aos anos 70 a revista continuou com outras temáticas e outro título.
A Biblioteca da Secretaria-Geral da Educação e Ciência possui alguns exemplares desta revista, a que poderá aceder aqui.

Revista Je sais tout (*)

1ª edição de 15 de fevereiro de 1905


Revista Je sais tout (*)

1ª edição de 15 de março de 1905

Revista Je sais tout (*)

Edição de 15 de junho de 1905

Revista Je sais tout (*)

Edição de 15 de dezembro de 1906

Revista Je sais tout (*)

Edição de 15 de junho de 1914

Revista Je sais tout (*)

Edição de 15 de junho de 1917



(*) Imagens retiradas da internet

MJS e MEE